Meia-noite. O eco das badaladas se espalha pela casa vazia. Faz exatamente um ano que ela se foi. O vazio grita ainda pelos recintos. Seus discos não tocam mais. Sua prateleira de livros está coberta de poeira. A gaveta de seus diários permanece sem suas letras. Ela me deixou uma mania de escrever. Compus uma carta por dia, das quais ela nunca saberá da existência. "Eu te amo". "Volta". Frases perdidas e sem alcance. Nunca entenderei o porquê da sua partida. Já se foram 366 dias. Sim, esse ano foi bissexto. Um número par de dias em que lutei contra demônios internos e não cheguei a uma conclusão. Pensei que tudo houvesse ficado para trás, que o sentimento tivesse ao menos adormecido. Então, ontem, eu vi seus pais dançando no parque. Tocava uma música de improviso, feita por uma pequena orquestra. Várias pessoas dançavam. A música era a nossa. Impossível não fazer a ligação. Senti as lágrimas escorrerem e corri quando vi que seus pais haviam me percebido ali. Percebi um sorriso antes de sumir ao virar uma esquina. Corri até chegar em casa. Corri como nunca. Quando me dei conta, precisava correr mais. Deixei as coisas em casa e fui correr em volta da lagoa. O tempo era frio e eu tremia por fora e por dentro. Arrepiada pela baixa temperatura e tomada por tantas emoções que me perdi. Quando olhei em volta, não me dava conta de onde estava. Havia deixado o circuito da lagoa e não reconhecia a redondeza. Passei por uma padaria e peguei um água de coco. Tão distraída, quase não pago. Pedi desculpas a moça que me chamou a atenção. Andei a esmo até chegar a um ponto conhecido. Corri pra casa. Ao entrar, joguei-me no sofá e me deixei ficar. Acordei para o sol e me dei conta do quanto o sentimento ainda vive em mim, ainda que eu não queira. O telefone insiste em tocar e eu me recuso a atender. Não quero saber de nada agora. Pensar em você me basta. Dormi pensando em nós. Acordei de novo e me dei conta de que não fui trabalhar. Para minha alma era feriado. Feriado de sonhos. Percebi que não. Resolvi olhar as malditas chamadas que interromperam meu pensar tantas vezes ontem. Quinze chamadas do serviço. Uma de mãe. Uma de pai. Retorno depois. Uma de um número desconhecido. Resolvi chamar, a curiosidade foi maior. O telefone tocou até cansar e fui jogada para a caixa postal. Detesto deixar recados. Estava prestes a desligar quando sua voz soou do outro lado. Decidi que estava sonhando e voltei a dormir...
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