Minha casa é um tambor, quando este bate, o coração entra no ritmo. Minha alma faz barulho quando toca o atabaque. Meu corpo se levanta em dança, ainda que eu esteja sentada. O batuque me abre um sorriso involuntário. Com os olhos fechados, vejo o som estremecendo o ar, sinto o vibrar da pele pulsando com o sangue. Abro bem os ouvidos e sei de cor um samba que nunca dancei. Nada me desperta mais que o toque do percursionista. Na levada da batida, ouço um ponto e me conecto com tudo ao meu redor. O tambor é minha casa e nele resido contente. Conto as batidas no couro e no coração: são as mesmas. O toque das mãos embala os pés e vou por aí. Rápido ou lento, o tocar me leva sem rumo, mas não me perco porque o som é o meu norte, ele sempre me transporta para os lugares mais intimistas. Com o tambor, eu me conheço, sei quem sou e aonde quero ir; com ele chego às estrelas e volto sempre a sorrir. O tantã me traz lucidez e me mostra quem posso ser. Viajo com a música e estou onde devo ser. A toada me transforma naquilo que posso. Minha casa é um tambor; quando este bate, meu espírito se deleita. Sou livre quando soa o esse ritmo. Quando toca a caixa, eu não preciso de mais nada e não há problema que não se possa resolver. Envolvida pela cadência, sei o que nunca ousei perguntar. O instrumento me traz lembranças e cria coisas que só ele é capaz. Esse barulho que me eleva, põe-me os pés no chão a sonhar, põe-me os pés no chão pra lá e pra cá. No ir e vir, sou mais eu do que deixo qualquer um ver e, de repente, eu sei até mesmo dançar. O tambor é minha casa e ali eu posso morar. No tom do tanto que toca o tantã, todo o corpo começa a toar. Minha casa é um tambor e ele toca sem parar. E, no ritmo do atabaque, eu sigo bailando a vida.
segunda-feira, 30 de junho de 2014
domingo, 29 de junho de 2014
Reticências
Hoje me deu de escrever. Relendo velhos textos, percebi que
uso as mesmas figuras, as mesmas metáforas pra dizer de você. Recorrentemente
falo do seu sorriso, volta e meia digo do tecer estórias imaginárias – já que
não te tenho de verdade –; sonhos, ilusão, mente insana, todos termos que
definem a relação que nunca foi entre mim e você. Escrevo sem fim sobre um
assunto morto que insisto em querer reviver. Parece que esse ato de colocar “no
papel” as coisas que sinto tem a força anulada cada vez que o assunto é você.
Escrevo para tentar tirar de mim essa vontade, mas a cada letra esta fica mais
forte. Mas falta... falta você. Esse ser quase inventado, esse você ausente o qual deixa no ar reticências vazias que tento preencher, mas não há sucesso. Escrevo pelos cotovelos e digo sempre o mesmo: o não te ter. Vem então um aperto sem abraço para cada momento que escrevi e nunca foi vivido. A essa altura, chego a temer a loucura: será que você alguma vez existiu? Juro ter te visto e até já ter te sentido, mas cadê que não te acho pela vida? Enquanto sigo, sonho acordada o futuro do "sim" e vivo o "não" calada como quem sabe viver na gravidade zero, flutuando a esmo sem companhia. Não te ter me ensinou certas coisas. Ensinou-me sobre mim e sobre os pequenos prazeres de vencer debates internos e de viver comigo e só. Mostrou-me que estar só não é estar sozinha. Todavia o maior ensinamento foi sobre aprender a desistir das coisas impossíveis (sim, há de se batalhar pelas causas difíceis, mas lutar em uma guerra perdida implica dispêndio de energia e, quiçá, de vida). Foi devido a isso que decidi deixar sua imagem vagar pelo espaço sideral e desligar minha mente para as possibilidades de você - até porque elas não existem. De hoje em diante, sigo sem esperar seus olhos nos meus e espero que estes estejam livres para ver toda a beleza do que há por vir. Você: balão de hélio que se perde da mão da criança. Sua imagem: um borrão de uma memória distante. Eu: ser errante pela vida, em busca do viver.
sábado, 21 de junho de 2014
Espiral
All but a
straight line. Já faz horas que essa frase ressoa em minha mente, indo e
vindo entre capítulos de um livro que agora pende sobre a mesa de cabeceira.
Tudo menos uma linha reta. É nisso que me pego pensando toda vez que seu rosto
estoura como um balão em minha retina, queimando seu sorriso na minha visão.
Quantas voltas espiralares terei de dar antes de te dizer que te quero? Quantos
braços vou ter de ver ao seu redor antes de entender que você não pode ser
minha? Quanto tempo terá de passar? Eu repito a mim mesma todos os dias que
você não me quer do modo que eu gostaria, porém, tola, insisto em teimar que há
uma chance. Minha vontade é gritar aos quatro ventos o que quero.
Eu quero mesmo é seus lábios nos meus, sua mão na minha e
caminhar. Ver, conhecer e me esbaldar no seu sorriso. Eu quero saborear sua
alegria e nadar nos seus olhos de mistério. Eu quero brindar cada sua vitória e
ninar seus sonhos nos momentos ruins. Quero andar ao seu lado e me dizer sua
para quem quiser ouvir.
Mas entre o querer e o ter existe o espaço de um infinito.
Entre o desejo e o toque há um milhão de palavras não ditas que nunca chegarão
ao seu ouvido. E entre o real e o imaginário, mergulho no mundo dos sonhos onde
te tenho para mim.
Cenário
Nem meus sonhos eu domino mais; são tantas coisas que acho
já não ser capaz de ler os sinais. Interpreto tudo como quero e, no fim, me
perco sozinha na estrada, esperando pela mão que nunca toca a minha. Uma
mensagem, um sorriso... é o bastante para que eu me perca em você e crie
estórias tantas na minha mente. Vem o tempo e me prova, por a mais b, que cada
linha que teci nesse conto foi bordada só por mim em devaneios. Eu tento
entender o mundo e as coisas como eles são, entretanto as minhas criações me parecem
sempre tão mais saborosas... e é com elas que me deleito, que enfrento a nua e
crua verdade de que você não me quer, já que é mais fácil viver na ilusão do
que enfrentar o fato de ser colocada sempre na fila das amizades. Sempre que
estamos próximas, eu quero estender minhas mãos e tocar seu rosto, gravar seu
sorriso com o tato e ter sempre uma flor pronta a te entregar ou um poema
piegas – como se eu fosse remotamente capaz de declamá-lo. Ao invés disso, faço
piadas idiotas e brincadeiras sem sentido com as quais pelo menos posso abrir uma
sua risada, dessas que fazem meu mundo tremer. Com a vida e com o tempo,
aprendi lições várias, mas nenhuma se aplica a você, que invade meu
inconsciente como se soubesse os caminhos do meu querer. Enquanto não te tenho
minha, continuo tecendo cenas que, provavelmente, nunca sairão do espaço da
imaginação, mas que me bastam para seguir.
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