sábado, 27 de setembro de 2014

Saravá os Erês!

"Eu quero doce, eu quero bala, eu quero mel pra passar na sua cara". Enquanto eu canto isso, Aninha me ri um riso gostoso por eu ter acordado tão feliz hoje. Diz que é pra ser assim sempre. As flores que enfeitam o altar e a luz das velas se mesclam ao cheiro doce e levantam o astral da casa inteira. A alegria grita alto (redundante e retumbante, também), como quem desperta a criança interior, que, agora, não quer mais dormir, quer brincar pela vida. E eu deixo. Deixo que brinque e que traga a doçura e a leveza. Tenho aos poucos aprendido a ser mais assim: mais amor dado de graça e com graça, mais ternura no viver, mais inocência no entender, mais liberdade para voar mais distante. Tirar minha criança interior do castigo que lhe impus por tantos anos fez de mim mais pluma, que vaga no tempo e não deixa as obrigações pesarem sobre os ombros. Deixar a alegria ter seu lugar me mostrou que os medos existem, mas eu não preciso me deixar abater por eles. E o que as crianças têm me ensinado é que o caminho é mais belo, se nos deixarmos ver as coisas com o olhar de novidade e de gratidão que elas possuem. Deixei a criança acordar e quem não quer que ela durma sou eu! Quero mais que eu possa espalhar a sutileza de seu sorriso por onde eu passar, o mel do seu beijo pra quem precisar, a brincadeira do seu carinho pra quebrar as tristezas! Saravá!

sábado, 20 de setembro de 2014

Hora do chá

Chá de camomila, por favor. Ela vai querer o mesmo.
É para já, senhor.
Desde quando você decide o que vou tomar?
Leve na conta de uma intuição, ao invés de me colocar como a possessiva que decide por você.
O que você quer dizer?
Algo me intuiu a pedir isso por você.
Você está dizendo que preciso me acalmar?
Talvez eu esteja.
Mas eu estou calma.
Talvez esse estado não dure.
O que você quer dizer?
Não sei... a gente nunca sabe o que a vida vai trazer.
Essa conversa está começando a me deixar nervosa.
Não é minha intenção. Mudemos de assunto.
E sobre o que você quer falar?
Não sei... qualquer coisa amena que não te irrite.
Você me chamou aqui pra isso?
Não. Eu te chamei aqui porque queria te ver.
Queria me ver a troco de quê?
Precisa ter algo em troca?
Se você me tirou de casa para isso, eu vou embora.
Não! Espere! Eu preciso... preciso olhar para você.
E o quê você espera ver?
Você. Seus olhos. Seu sorriso. Esse sorriso mesmo!
Qual sorriso?
Esse que você solta quando pensa que ninguém presta atenção.
E desde quando você repara isso?
Desde a primeira vez que te vi.
Com licença, senhores: o chá!
Gratidão, moço. Está bom o chá?
Sim. Obrigada pela escolha.
Não há de quê. Acho que chá cabe em qualquer ocasião.
Veio a calhar esse chá. Precisava mesmo me acalmar.
Viu? Minha intuição funcionou... o que te deixa nervosa?
Esse teu jeito de me olhar.
Que jeito?
De quem vê minha alma. De quem me conhece.
Mas eu não te conheço?
Conhece em partes, mas parece que conhece mais do que eu conto.
Não são só palavras que contam histórias.
Como assim?
Gestos, olhares, tudo diz, mesmo que você não queira dizer.
Por exemplo?
Por exemplo, quando é que você vai criar coragem e me dizer que acabou?
Acabou o quê?
O seu amor por mim.
Quem te disse?
Seus olhos, o movimento do seu corpo.
Desde quando você entende disso?
Desde quando aprendi a te entender.
E o quê você acha que entende de mim?
Muitas coisas, mas a principal é que você não quer mais estar aqui.
Se não quisesse, não estaria.
Refraseio: muitas coisas, mas a principal é que você não quer mais estar comigo.
De onde você tirou isso?
Do que você não disse, mas seu corpo sinalizou... Estou errada?
...
Você não consegue nem me responder?
Você está certa... mas... a culpa não é sua....
Não me venha com essa de “não é você, sou eu”.
Mas...
Não. Poupe-me de discursos prontos e frases feitas. A verdade é que você não me ama mais e a culpa é minha se não prendo sua atenção.
Não é bem assim...
Claro que é. Mas até agora você não disse.
O quê?
Que não me ama mais.
É preciso que eu diga?
Sim. Dá um ar de finitude.
Eu não te amo mais.
Ok. Era o que eu precisava ouvir.
Por quê?
Para conseguir aceitar e seguir. Foi bom enquanto durou. Não! Nada de frases prontas. Fui feliz com você, é uma pena. Aproveite o chá e o dia.
Você vai embora assim?
Vou. Preciso me distanciar, dar umas voltas.
E vai me largar aqui?
Preciso. Preciso ser eu a ir embora.
Por quê?
Para não te ver partir. Adeus.
Nunca mais te verei?
Quem sabe... na vida há encontros e desencontros.
Me desculpe?
Não há nada a desculpar. Adeus.

Adeus.