sábado, 16 de janeiro de 2021

Quereres

 

Queria a sorte da fazê-la sorrir todos os dias, de olhá-la nos olhos e saber-lhe inteira, de reconhecer cada desejo e tentar realizar, de a fazer se arrepiar dos pés à cabeça. 

Queria a leveza de poder olhar para o lado e conseguir respirar aliviada, com a certeza de que ali fazia morada um amor tranquilo e parceiro. 

Queria um relógio que marcasse o tempo delas de forma diferente das horas do mundo, em que o ponteiro dos segundos marcasse as risadas; o dos minutos, os beijos e abraços; o das horas, o amor crescente. 

Queria um universo que barrasse o mal do mundo, como um muro-peneira que só permitisse o bem de se aproximar dela.

Queria que cada momento juntas fosse o primeiro  com a antecipação do que estava por vir, o cheiro de novidade, o calor a se espalhar -, mas também que fosse como a mais recente - com as memórias, os sentires, os saberes.

Queria ser a certeza em um mar de dúvidas, o aconchego nos achaques do mundo, a mão a ser segurada no medo, o cuidá-la em tempos de sofrer.

Queria se desmontar pra que ela visse cada parte, queria arder junto ao corpo dela em um calor só delas, queria tocar-lhe a alma com gentileza, queria estar ao lado dela como quem não tem aonde ir,  queria escolhê-la todos os dias.

Queria tanto, mas nada mais podia. Ficar doía, ir embora também.

É que dizer adeus não é fácil pra ninguém, menos ainda pra quem sabe que tinha a melhor mão possível na sua, mas é preciso reconhecer as derrotas pra seguir sem pesos e sem medo de onde se vai chegar e quem é que vai caminhar junto. É preciso reconhecer quando duas mãos não mais se tocam. É preciso partir.